"Somos o que não jogamos fora" Ítalo Calvino

quarta-feira, 30 de março de 2011

“O tempo de cada um” ou “Breves anotações de inspiração heideggeriana sobre o tempo de entender, a angústia como condição e o ser-com”

"Na maior parte das vezes e antes de tudo, Dasein se entende a partir de seu mundo, e a Co-presença dos outros vem ao encontro nas mais diversas formas, a partir do que está à mão dentro do mundo." (Heidegger, M. Ser e Tempo; p. 171)

Tem coisas que a gente demora mais pra sacar. Precisam de amadurecimento pra se entender. E tem as que a gente passa a ver de outro jeito, porque nosso olhar mudou.
Às vezes, a gente entende tarde demais e se revolta. Ou não; quando se dá conta de que cada um tem o seu tempo, a gente aceita o próprio ritmo. Meio que se conforma porque não daria pra ser diferente mesmo. Mas se conformar é diferente de se acomodar. Acomodar-se é ficar inerte, entregar os pontos. Conformar-se, não. É simplesmente acatar e viver com aquilo. As coisas com as quais me conformei nunca me impediram de seguir.
É claro que a idade traz mais clareza, até porque traz mais vivência; se bem que tem aquelas pessoas que não crescem nunca e jamais enxergam com nitidez. Acho que com a idade aprendi a me entender melhor, me tornei mais analítica. Mais chata, com certeza: com as minhas escolhas, com as minhas posturas – e com a dos outros também, não nego. Na verdade, acho que se o entendimento vem e traz conforto, ótimo.
Mas se ele vier trazendo desconforto, chateação, angústia, não é necessariamente ruim. Porque daí a gente tem a chance de pensar pra tentar sair da angústia. Não que seja possível se “desangustiar”, mas o movimento é necessário. Pensar o que talvez a gente tenha feito de errado, tentar compreender por que demorou tanto para a ficha cair... Ou sei lá o quê. Perguntas são sempre bem-vindas.
O ideal é que a gente encontre um jeito de viver bem e que seja um jeito próprio; não tem que ter uma referência necessariamente. Pode parecer meio louco, meio esquizofrênico dizer isso, mas acho que é mais saudável do que ficar repetindo. Se repetindo. Mas isso tudo é bem difícil e dói muito mais.
Sem contar que a gente tem de passar por isso sozinho, sem ninguém pra vir junto, pra segurar na mão. Até pode ser que o entendimento venha num processo de “com-preensão”, que inclui certamente a participação do outro, mas a angústia tem essa dimensão da solidão, por mais que seja uma condição de todos os seres humanos e, em certa medida, possamos compartilhá-la. O homem precisa ser, antes de tudo, absolutamente solitário pra poder ser-com o outro.
A condição humana é tão bonita quanto dolorosamente trágica.

Um comentário:

  1. Nem sempre tenho certeza se a idade traz mais clareza ou se clarezas diferentes. É como um conflito entre acreditar-se mais experiente e sábio, e tão ignorante quanto antes. Ou até não conseguir pesar bem entre o que o tempo nos dá e o que nos tira.

    ResponderExcluir